Valter Vinagre
Fotografia
CAOS | casa d’artes e ofícios
20 de outubro de 2017 a 14 de novembro de 2017
“Do Amor aprisionado. Do amor que se entranha mal nascemos e nos transcende na morte. Dos fragmentos que se perpectuam, sem que dependa de nós.
(…) Nada desejo no mundo senão ver-te. Lembra-te ao menos de mim. Bastar-me-ia que me lembrasses, mas eu nem disso tenho a certeza. Quando te via todos os dias não cingia as minhas esperanças à tua lembrança mas tens-me ensinado a submeter-me a tudo quanto te apetece. (…) A crueldade da tua ausência, talvez eterna, em nada diminuiu a exaltação do meu amor. Quero que toda a gente o saiba, não faço disso nenhum segredo; estou encantada por ter feito tudo quanto fiz por ti, contra toda a espécie de conveniências. E já que comecei, a minha honra e a minha religião hão-de consistir só em amar-te perdidamente toda a vida.
Não te digo estas coisas para te obrigar a escrever-me. Ah, nada faças contrafeito! De ti só quero o que te vier do coração, e recuso todas as provas de amor que tu próprio te possas dispensar. Com prazer te desculparei, se te for agradável não te dares ao trabalho de me escrever; sinto uma profunda disposição para te perdoar seja o que for. (…) Faz o que quiseres: o meu amor já não depende da maneira como tu me tratares. Desde que partiste nunca mais tive saúde, e todo o meu prazer consiste em repetir o teu nome mil vezes ao dia. (…) e passo o tempo a olhar o teu retrato, que amo mil vezes mais que à minha vida. Sinto prazer em olhá-lo, mas também me faz sofrer, sobretudo quando penso que talvez nunca mais te veja. Por que fatalidade não hei-de voltar a ver-te? Ter-me-ás deixado para sempre? Estou desesperada, a tua pobre Mariana já não pode mais: desfalece ao terminar esta carta. Adeus, adeus, tem pena de mim!”
“Cartas Portuguesas”, Soror Mariana Alcoforado (1640 -1723), Traduções de Eugénio de Andrade, Modo de Ler, Porto 2012 – Segunda Carta, último parágrafo.
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